Política
Na Alems, deputados dizem que reativação da ferrovia tornará MS um potencial logístico
A Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALEMS) realizou na manhã desta sexta-feira (9) a audiência pública “A importância da reativação da Malha Oeste Ferroviária: Mato Grosso do Sul nos trilhos outra vez”, por proposição do deputado estadual Zeca do PT (PT) e do deputado federal Vander Loubet (PT), no plenarinho Nelito Câmara. O debate reuniu representantes de diversos segmentos e levantou dados para elaboração de documentos que serão enviados ao Governo Federal para justificar a relicitação da ferrovia e tornar Mato Grosso do Sul um potencial logístico para o país e América do Sul.
Em nome da ALEMS, Zeca do PT explicou que a discussão é pensar no futuro, visto que a Rota Bioceânica, rodovia que ligará o Atlântico ao Pacífico, está em obras ligando o Brasil ao Chile para o escoamento da produção. “Ao lado dessa rodovia temos o trem no Brasil e no Paraguai foi deixado o espaço para os trilhos aonde ainda não existe. Olha a infraestrutura logística que estamos montando para superar a pobreza e o abandono dessa parte da América do Sul, incluindo Mato Grosso do Sul, tornando em uma das regiões mais prósperas do mundo. Imagina você chegar com toda nossa produção aos portos do Pacífico, encurtando em 10 mil quilômetros o transporte para o mercado asiático. Imagina você trazer o gás da Argentina, do maior campo de gás decoberto na América Latina, juntando com o gasoduto da Bolívia e distribuir para o Brasil. Só Mato Grosso do Sul é capaz de materializar esse sonho”, destacou.
Vander Loubet completou. “Não tem como falar na integração sem falar do transporte intermodal, que já existe aqui. A Malha Oeste foi uma privatização que deu errado. Queremos então fazer essa movimento político bem forte para retomar. É uma ferrovia consolidada, então não precisa de licenciamento ambiental. Temos carga para transportar. Reunimos todas as condições e agora precisamos pressionar o Governo Federal para retomar essas discussões. Estou muito otimista, que essa é a principal obra que devemos dar uma resposta à sociedade. Olha o tanto de caminhões que trafegam e a ferrovia é um transporte mais barato e mais limpo”, ressaltou o parlamentar que quer levar uma comissão até o presidente Lula, para que saiba a realidade sul-mato-grossense.
Nesse sentido, o representante da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc), assessor Lucio Lagemann, explicou que o abandono da ferrovia traz um atraso ao crescimento do Estado, sem contar o valor histórico da malha, que possibilitou o crescimento de diversas cidades. Segundo a apresentação do assessor, em nome do Governo do Estado, em 2021 a concessionária atual da malha, RUMO S/A, obteve a aprovação do pedido de devolução do trecho em modelo amigável e, assim, o Estado autorizou os estudos para a relicitação por parte da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Em 2023 criou-se um grupo de trabalho para estudos para que em 2025 seja o prazo máximo previsto para a relicitação do ativo. O Governo do Estado estima que sejam necessários R$ 4 bilhões para a revitalização da malha.
“Esse recurso seria para a requalificação da ferrovia, com a substituição de dormentes. É uma ferrovia já existente, tem o berço já pacificado, não há necessidade de novas desapropriações e ela já corta o estado. Hoje, para fazer a construção de uma nova ferrovia precisaria de muito estudo de impacto ambiental e muito mais recursos. Temos que aproveitar aquilo que já está pronto. Temos um incremento significativo de cargas de mineração em Corumbá, com o licenciamento para 15 milhões de toneladas, sendo que a projeção dos próximos anos é de 50 milhões de toneladas. Isso torna evidente que precisamos atender a demanda, visto que é um local com muita geração de emprego. A ferrovia é o transporte mais adequado quando se fala de minério, que tem a necessidade de seguir longas distâncias, com um custo muito mais baixo do que pela rodovia”, argumentou Lagemann.
Ainda segundo o assessor da Semadesc, o Governo do Estado estima que com as novas fábricas do setor de celulose na região Leste, com aproximadamente 1,5 milhão de hectares de eucalipto plantados, a ferrovia reativada também iria beneficiar o escoamento da produção. “Sem contar a soja e o milho, cujo escoamento era feito, antigamente, via ferrovia. E perdemos isso. Só no trecho de Campo Grande a Três Lagoas, pela BR-262, trafegam 6 mil caminhões por dia. Isso é um perigo para a segurança do usuário, além de ser um transporte caro. Outra questão é o uso de fertilizantes pelo Estado, comprados da Bolívia, um grande fornecedor, que a reativação do trecho de 75 quilômetros de Corumbá a Porto Esperança vai ajudar a manter a boa relação”, contabilizou.
Representando o Governo Federal, a diretora do Departamento de Obras e Projetos do Ministério dos Transportes, Mariane Figueiredo da Silva Araújo, disse que a intenção é trazer transparência ao processo e que a União está aberta às ideias. Segundo ela, o prazo contratual para a nova concessão será de 60 anos. As obras no trecho entre Mairinque (SP) e Campo Grande (MS) devem ser feitas entre 2027 e 2029 e entre 2029 e 2031 de Campo Grande a Corumbá (MS).
“Fizemos uma consulta ao mercado, com operadores ferroviários e investidores e o resultado foi que não conseguimos um empreendedor para a malha completa, mas que havia interessados para partes da malha. Então passamos a pensar como não ‘picotar a malha’, para manter a integração e ao mesmo tempo trazer uma atratividade para o empreendedor operar e revitalizar a malha. Fizemos então um desenho que hoje a ANTT está apresentando para o TCU [Tribunal de Contas da União] para poder lançar, de forma a flexibilizar para o licitante, com a possibilidade de devolução de trechos aos governos estaduais de Mato Grosso do Sul e São Paulo”, divulgou a diretora, que disse ainda que um grupo de trabalho vai avaliar a proposta feita pela própria Rumo S/A em manter parte da operação.
No evento, ainda compôs a mesa o economista e consultor de logística, Luiz Antônio Pagot, que afirmou que existe a possibilidade de retomar a operação na mesma bitola em que está construída. “Um ponto de preocupação é que o ano passado em 2023, só de cargas primárias, do setor agropecuário, o Brasil movimentou 320 milhões de toneladas, com o transporte feito por 300 mil carretas. A menor projeção para 2030 serão 400 milhões de toneladas. Só no último ano o Brasil abriu 72 novos mercados, ou seja, passamos a vender muito a outros países. Frutas, couro, madeira tratada, enfim, isso demonstra uma enorme demanda. E a ferrovia tem uma importância extraordinária, não só para o Estado, mas para o país. A cada dia que passa roubam mais dormentes, mais bitolas. É lamentável ver a degradação. E nosso trem de turismo, que foi feito um investimento grande, infelizmente a falta de manutenção acabou paralisando. É importante para geração de emprego e renda”, justificou.
Com dados de outras audiências públicas realizadas pela ALEMS, o deputado estadual Pedro Pedrossian Neto (PSD) requereu um esforço conjunto para convencer o Governo Federal da importância de reativação do trecho Campo Grande a Ponta Porã, não incluído no projeto de relicitação. “É uma ferrovia de 1914. Estamos em 2024, Mato Grosso do Sul bombando e não temos uma ferrovia ativa um século depois. Isso é o retrato de uma tragédia. No passado via-se a importância estratégica e hoje não conseguimos ver isso? Fizemos uma privatização malfeita e agora devolvem uma ferrovia sucateada. É necessário que se faça uma revitalização, via Orçamento Geral da União. Uma vez revitalizado aí colocamos para a concessão, para não depender exclusivamente da iniciativa privada. Pedimos a inclusão do Ramal de Campo Grande a Ponta Porã, pois é no Centro Sul do Estado que estão as maiores produções de soja, milho e cana para açúcar e biodiesel, além de 853 mil toneladas de produção de frigoríficos. Não dá para aceitar não incluir isso”, concluiu.
O debate também foi acompanhado pelo deputado estadual Pedro Kemp (PT), pela deputada federal Camila Jara (PT), pelo prefeito de Ribas de Rio Pardo, João Alfredo, diversos vereadores e representantes da Fecomércio, Sindicato dos Ferroviários, Comitê Sindical da Rota Bioceânica, Sindicato da Indústria e Construção Pesada, do Iphan e de comunidades indígenas.