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14 de Outubro de 2025

Cultura/Turismo

Com indígena e idosa, filme ‘A Trovadora e a Poeta’ é gravado em Campo Grande

Gleycielli Guató e Terezinha Pantaneira são as protagonistas do curta que deve estrear no fim do ano.

Em uma rua de terra no bairro Jardim Monte Alegre, em Campo Grande, o movimento das câmeras anuncia o início de uma travessia. Durante cinco dias, uma casa em um conjunto habitacional se transformou em cenário de poesia e resistência: é ali que nasceram as imagens de “A Trovadora e a Poeta”, curta-metragem de ficção com elementos documentais que une duas mulheres reais — Terezinha Pantaneira, trovadora popular e cadeirante de 76 anos, e Gleycielle Nonato Guató, poeta indígena da etnia Guató. As gravações aconteceram na primeira quinzena do mês de outubro.

Com roteiro escrito pelas próprias protagonistas ao lado do diretor Marcus Teles, o filme acompanha o encontro dessas duas mulheres em seus cotidianos — uma senhora que luta para manter a dignidade diante das barreiras da cidade para uma pessoa com deficiência e uma jovem que busca se afirmar como artista em meio à dureza da vida urbana. Entre as duas, nasce uma amizade improvável, tecida pela poesia, pelo afeto e pela força de continuar criando, mesmo quando o mundo insiste em impor silêncios.

“Foi um processo muito delicado e vivo. A fronteira entre o que é encenação e o que é a vida se torna quase invisível”, diz Marcus, que também assina o roteiro. “A minha função como diretor foi mais a de escutar do que conduzir — criar um espaço de confiança onde Terezinha e Gleycielle pudessem se expressar com verdade. O mais bonito é que esse filme também marca a estreia de Terezinha como roteirista e atriz, e ver uma mulher já idosa se descobrir nesse lugar criativo é profundamente inspirador”.

Aos 76 anos, Terezinha faz sua estreia no cinema. Ex-funcionária pública e trovadora de longa data, ela carrega uma história marcada por lutas e reinvenções. “Eu sou da juventude de 60, uma geração que revolucionou o mundo, que questionou tradições e abriu caminhos. Sempre fui de buscar novos valores, de enfrentar o que não achava justo. E agora, com essa idade, estou estreando como atriz, com uma mensagem muito clara: pessoas com deficiência existem e o mundo ainda não é acessível a elas. Eu só percebi isso quando passei a usar cadeira de rodas, depois da Covid. A acessibilidade quase não existe — e essa realidade precisa mudar. O cinema é uma forma poderosa de dizer isso”.

A obra conta ainda com uma participação especial do ator Breno Moroni, que já estrelou inúmeras novelas da Rede Globo — e está em seu 99º filme —, misturando o real e o simbólico com uma leveza rara.

“A água e o rio são elementos que guiam todo o filme”, explica Marcus. “Eles simbolizam o fluxo da vida, a passagem do tempo e também a memória — aquilo que corre, muda e permanece. Para Terezinha, o rio é lembrança da infância; para Gleycielle, é o elo com sua ancestralidade Guató, o povo da água. A partir disso, busquei uma linguagem visual que respeitasse esse ritmo: fluido, contemplativo, com planos que respiram. O silêncio também é parte essencial dessa poética — é nele que a palavra ganha força, e o olhar pode se tornar escuta”.

Gleycielle Nonato Guató, que interpreta Lucila — personagem inspirada em si mesma —, também assina o roteiro. “Eu me vejo muito nessa personagem. Eu já morei em Campo Grande, trabalhei em terminais, vendi salgado, vendi chip de celular. Nunca imaginei que aquela menina que sonhava em estudar e escrever estaria hoje fazendo poesia dentro do cinema. A Lucila é uma homenagem à minha avó, e o filme é uma homenagem a todas as mulheres simples que têm dentro delas uma poeta. A poesia foi o fio que uniu Lucila e Terezinha. Foi o elo que virou amizade, e a amizade virou ancestralidade”.

Para Gleycielle, o rio é mais que paisagem — é espiritualidade e espelho. “Eu sou banhada pelas águas do Taquari. O rio é esperança e também destruição, é cura e é memória. Quando a Lucila faz o ritual de cura com a Terezinha, eu penso que estamos curando muitas coisas: a dor, a saudade, a desesperança. O rio traz esse infinito de possibilidades”.

Na convivência entre as duas protagonistas, Marcus encontrou o coração do filme. “Terezinha traz uma sabedoria antiga e uma sensibilidade enorme. É comovente ver alguém se reinventando na velhice, encontrando na escrita um novo modo de existir. Já Gleycielle carrega a potência da juventude e da arte como resistência. Entre as duas, nasce um espelho: uma troca de força e ternura. Essa convivência foi, mais do que um processo de filmagem, uma vivência de aprendizado”.

Para Terezinha, esse aprendizado também é pessoal. “Eu me sinto contemplada por essa troca. Conviver com Gleycielle me emocionou, porque eu sempre estive muito próxima da luta indígena, da valorização dos povos originários. Filmar ao lado de uma jovem Guató foi um presente”.

Ao fim, “A Trovadora e a Poeta” se revela como um rio que corre entre tempos e corpos. Um filme sobre resistência e delicadeza — sobre o poder da palavra que cura e da arte que transforma. “Acredito que a delicadeza também é uma forma de resistência”, reflete Marcus. “Há uma força imensa em quem escolhe o afeto, o cuidado e a poesia como formas de existir. O filme entende que a luta e a ternura nascem uma da outra. A poesia não é fuga — é enfrentamento. ‘A Trovadora e a Poeta’ é, no fundo, um rio. Ele resiste porque passa, e passa porque resiste”, finaliza.

A produção conta com investimento da PNAB (Política Nacional Aldir Blanc), do Governo Federal, através do MinC (Ministério da Cultura), com edital operacionalizado pela Prefeitura Municipal de Campo Grande, por meio da Fundac (Fundação Municipal de Cultura).

Equipe técnica:

Direção: Marcus Teles
Roteiro: Gleycielli Nonato Guató, Marcus Teles e Terezinha Pantaneira
Produção: Jefley M. Cano
Direção de fotografia: Daniel Felipe
Operador de câmera: Márcio Padilha
Técnicos de som: L. Germanotta Cinema e 4real.wav
Assistente de som: Ellen Karina Lazcano
Atuação:  Terezinha Pantaneira, Gleycielli Nonato Guató, Breno Moroni, Danielly Frangilo e Lilian Arruda
Trilha sonora original: Gian Markes
Edição de imagem e som: Rafael Viriato
Produção executiva: Gleycielli Nonato Guató
Assistente de produção executiva: Lucas Moura
Assessoria de imprensa: Lucas Arruda e Aline Lira

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