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“Da Quebrada à Universidade” segue com debates sobre a presença periférica em espaços acadêmicos da Capital

A Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) virou palco de um encontro semanal pouco comum: pessoas de diferentes “quebradas” de Campo Grande-MS que levam o rap e o funk para dentro da Universidade e, junto com textos acadêmicos, abrem debates sobre temas como masculinidade, racismo, democratização do acesso à educação e identidade cultural periférica.
Esses encontros, que nascem justamente dessa conexão entre saberes populares e acadêmicos, partem do projeto de extensão “Da Quebrada à Universidade”, uma iniciativa que segue acontecendo até o fim do ano com encontros gratuitos toda quarta-feira, abertos à comunidade externa interessada.
Durante as duas primeiras reuniões, em 13 e 20 de agosto, os participantes debateram as músicas “Nego Drama” (Mano Brown e Edi Rock) e “Brabos 2” (Favela Cria), refletindo sobre as pressões, estereótipos e desafios enfrentados por homens negros nas periferias. Em ambos os encontros, a discussão foi ampliada com a leitura e análise do capítulo “Escolarizando Homens Negros”, da renomada intelectual feminista negra Bell Hooks, extraído do livro We Real Cool: Black Men and Masculinity.
Experiências pessoais de sentimento de exclusão no ambiente escolar também foram relatadas, assim como de violência policial, falta de referências positivas e a dificuldade de ingresso na Universidade Pública. Nas conversas a força do rap como ferramenta de conscientização e espelho para a juventude foi destacada, por meio da análise de letras de músicas que retratam de forma crua e poética a realidade periférica.
Outros temas também pautaram essas discussões, como por exemplo:
- A pressão para performar uma masculinidade dura e não intelectualizada, a internalização da inferioridade (questões que muitas vezes podem afastar os jovens negros da escola e do prazer pela leitura);
- Merecimento e autoestima na periferia;
- A invisibilidade das favelas e da periferia em Campo Grande-MS, questionando a narrativa de que a capital não tem comunidades vulneráveis;
- A gentrificação e como ela pode contribuir para afastar e excluir ainda mais as populações periféricas;
- A inveja e a desunião dentro das próprias “quebradas”, que impulsionam e impedem o crescimento coletivo;
- A importância do conhecimento de rua, mas também da conquista de espaços acadêmicos como forma de resistência e transformação;
- Relações entre cultura periférica, conscientização e educação crítica;
Próximos encontros
O ciclo de debates continua aberto à comunidade periférica de Campo Grande, sem restrição de escolaridade ou idade. Os encontros acontecem toda quarta-feira, às 19h, na UFMS, alternando entre leituras acadêmicas e análise de letras de rap ou funk.
No dia 03/09, será encerrada a discussão sobre o tema “branquitude” e, em seguida, será dado início a uma nova temática sempre com recurso de novas músicas e textos. A iniciativa é um espaço de formação que fomenta o acolhimento e o empoderamento com troca de saberes, mostrando que a “quebrada” também pode produzir teoria, criticidade e realizar o Ensino Superior.